Superbactérias crescem às custas do uso inadequado de antibióticos Tratar gripe com antibiótico está entre erros mais comuns em relação ao uso, segundo infectologista; país apresenta superbactéria acima da média Superbactérias crescem às custas do mau uso de antibióticos
Uso de antibióticos de forma inadequada estimula seleção de bactérias mais fortes
O mau uso de antibióticos, remédios com finalidade de combater bactérias, é um dos principais fatores que estão levando à sua maior resistência, gerando as chamadas “superbactérias”, de acordo com a infectologista Flávia Rossi, diretora do Serviço de Microbiologia do Hospital das Clínicas de São Paulo.
“As bactérias estão progredindo em termos de resistência. Trata-se de um fenômeno mundial, uma preocupação de saúde pública. As superbactérias não estão somente em hospitais, apesar de se ter uma melhor percepção delas dentro das UTIs. Envolve também bactérias na comunidade. Um exemplo é a gonorreia, que tem estado cada vez mais resistente”, afirma.
Segundo ela, superbactéria é qualquer bactéria que apresente resistência a antibióticos comuns. Antibióticos utilizados de maneira inadequada – com finalidade, dosagem e tempo incorretos – promovem a seleção das bactérias mais fortes. “Pode-se adquirir superbactérias tomando antibióticos ao longo da vida”, afirma. “Há mais bactérias no corpo humano do que células”, completa.
A superbactéria mais frequente no Brasil é a KCP, que se propaga apenas em ambiente hospitalar. A infectologista explica que ela apresenta mortalidade de 50% e está presente na maioria dos hospitais brasileiros. “A presença de superbactérias em hospitais no Brasil está acima da média mundial”, diz.
A bactéria KCP está presente naturalmente no corpo humano. A diferença entre a bactéria KCP e a superbactéria KCP e que a segunda adquiriu enzimas que destroem os principais antibióticos utilizados atualmente.
“Antibióticos que antes eram considerados poderosos, hoje não são mais. Há medicamentos cuja resistência saiu de 20% para 80%. Existe uma dificuldade em escolher antibiótico adequado em função da resistência das bactérias. Isso é frequente nos hospitais brasileiros”, afirma.
Para se proteger das superbactérias, a médica orienta, primeiramente não tratar gripe com antibiótico. A maioria das infecções respiratórias não é causada por bactérias, mas, sim, por vírus sobre os quais os antibióticos não exercem efeito. “Melhora por fora, mas por dentro, está filtrando as bactérias mais fortes”, afirma.
Ela ainda orienta a lavar as mãos com frequência, especialmente antes e depois de entrar em contato com pessoas doentes, evitar ir a hospitais sem necessidade e evitar alimentos e águas contaminadas.
“Atualmente, 700 mil pessoas morrem todos os anos em função da resistência bacteriana, mas a partir de 2050 a estimativa é de que esse número passe a 10 milhões anuais, superando o número anual de óbitos por câncer, que chega a 8,2 milhões”, afirma.
Outras medidas para não contribuir para o crescimento de bactérias multirresistentes é não suspender o uso do antibiótico quando sumir os primeiros sintomas. Diferentemente de outras medicações, o antibiótico deve ser tomado rigorosamente de acordo com os dias e o intervalo entre as doses prescritos pelo médico.
Além disso, evitar o consumo de álcool durante o tratamento, que, além de sobrecarregar o fígado, o efeito diurético da bebida pode reduzir a concentração do remédio no sangue.
Vale lembrar que o antibiótico utilizado juntamente com o contraceptivo pode cortar o efeito do contraceptivo.
E ainda, não se deve descartar antibióticos em lixo comum, pois seus resíduos, quando em contato com as bactérias do solo, podem favorecer o desenvolvimento de microrganismos resistentes. O ideal é procurar farmácias e postos que ofereçam locais de coleta.
Humanidade já enfrentou pandemias de bactérias
A infectologista Maria Lavinea Figueiredo, gerente médica da área de Anti-infectivos da Pfizer ressalta que, ao longo da história, a humanidade já enfrentou diferentes pandemias causadas por bactérias. Entre elas estão a peste bubônica, na Idade Média, a tuberculose, no século 19, a febre tifoide, na Grécia Antiga e na Europa nos séculos 17 a 19.
“No Brasil, quem nasceu em 1940 tinha expectativa de viver 45,5 anos, em média. Mas, daquela época para hoje, o brasileiro experimentou um ganho médio de 30 anos, especialmente em função do saneamento básico, da vacinação em massa e da descoberta dos antibióticos, que contribuíram para a redução das mortes por doenças infectocontagiosas e parasitárias”, afirma.
Ela explica que o primeiro antibiótico foi descoberto por acaso, em 1928, pelo médico britânico Alexandre Fleming. “Pesquisando substâncias capazes de combater bactérias em feridas, esqueceu seu material de estudo sobre a mesa enquanto saía de férias. Ao retornar, observou que suas culturas de Staphylococcus aureus estavam contaminadas por um fungo chamado Penicillium notatum”, diz.
Essa substância, que impedia o desenvolvimento das bactérias, após purificada, foi denominada penicilina – o primeiro antibiótico da história.
No ano passado, a OMS divulgou a primeira lista de bactérias resistentes a antibióticos, um catálogo de 12 famílias de bactérias que representam a maior ameaça para a saúde humana. A lista foi elaborada para orientar e promover a pesquisa e desenvolvimento de novos antibióticos.
Fonte: Portal R7